terça-feira, 24 de maio de 2011

ONNIM - Prof. Viviane Lima - Corporalidades negras na festa do Boi –18/05/2011

A relação trabalho e festa, homem e natureza, chegou na relação do homem com o boi. O negro aqui escravizado e o boi domesticado.
Amadu Amaral foi um pesquisador que tentou saber quem influenciou quem e depois não teve menor sentido, pois o boi é um animal que veio pro Brasil no processo de colonização.
A relação do homem africano com a natureza é de uma poesia e complexidade que não teremos entendimento

Na tradição africana não se separa o homem da natureza. São os 20 elementos que formam o ser humano. O criador é a junção de todos esses elementos da natureza e está presente no homem. A idéia de dissociação da natureza é ocidental. Esses 20 elementos vibram no ser humano até que saia a palavra, assim sendo o indivíduo é sua própria palavra. A mentira então é um desvinculamento de você com a natureza, com o criador, com o sagrado e por isso não é necessário escrever, pois a palavra tem poder em si.
O homem só sabe que ele é homem, porque está em contato com a natureza, em relação, e não superior e sim um de seus elementos que vai ser responsável de cuidar de outros elementos.
Num determinado momento com o contato com outras culturas do oriente, começa a aparecer na cultura africana, técnicas de agricultura, o aprendizado se dá a partir da observação de pássaros para saber como semear, do tempo do trabalho com as formigas, enfim respeitar essa generosidade da natureza.
Há contos que não são infantis, mas contados na infância para saber como aquela como aquela comunidade aprendeu a se relacionar com a natureza. Cada comunidade tem um animal Tóten e ele será base para as relações.
O boi em todo mundo se transformou em animal símbolo, mas diferenciado de cultura a cultura, mas geralmente está ligado a poder, pela sua estrutura física e que tudo nele se aproveita, até o berro.
No sudoeste de Angola, os Nanhecas, têm um culto ao boi, essa seria uma possível origem da festa do boi.

Aqui no Brasil se diz que tem origem portuguesa, mas não existe nenhuma comunidade branca que tem festa de boi.
O boi é um animal caro, vem originalmente de Cabo Verde no séc. XVI e vieram pra cá nos mesmos porões que os africanos escravizados, então os dois tem o mesmo patamar na sociedade brasileira. Na cultura africana eram iguais, mas em outras instâncias.
O boi é muito usado para sacrifícios, o mais bonito, mais gordo, era esse que era oferecido ao Soba seu sangue.
Para os Bijagós ( povo africano que habita um arquipélago de Guiné-Bissau), o boi é o animal máximo, o rei é enterrado com a pele, patas e cabeça do boi. Confeccionam máscaras de boi e se transformam. A máscara é um elemento fundamental para ritos de passagens nas comunidades tradicionais africanas, pois não é utilizada para esconder e sim para revelar os ancestrais, por isso cobre todo o corpo e sim o ancestral abençoa.
A relação com o animal muda com a chegada da escravidão, pois ela põe o boi em um lugar utilitário e o homem negro é comparado sendo chamado de “gado humano”, os dois tem o mesmo preço. O homem africano deixa de ter a natureza como aliada e passa a viver a mesma situação de opressão.
A queimadura que é feita no boi, também será usada no homem, as colheras, a vedação do rosto. A domesticação passa a ser referência para a escravidão.
Homem e animal: o escravo está comparado ao animal domesticado e o senhor ao animal de movimento.
RELAÇÕES ANIMAL NOMES
Escravo Boi Mimoso
Senhor Cavalo Veloz
Na relação com as mulheres negras, é em fotografias por exemplo: a mulher passa do exótico para o erótico e na literatura aparece a questão muito presente do cheiro e de sua animalização.
A relação do homem negro com a natureza é resgatada no desenvolvimento da manifestação do Boi Bumba. Mário de Andrade em seu registro usa o boi como elemento de unificação do Brasil, mas não cita o negro como produto desse acontecimento.
No Mali, os Sobobós têm máscaras de Antílopes muito parecidas com o Boi Bumba.
Na Nigéria, a cultura Ioruba, o artista só pode ver se a máscara está boa, no momento da dança, pois é quando ela se torna viva. Essa relação com a ancestralidade é a máscara.
Máscaras são representações artísticas, mas tem que ser um artista que tenha ancestralidade. Então a máscara seria uma dupla habitação: ancestral e descendente.
Bumba meu Boi, Boi Bumba, Boi de Bumba é uma auto tradição da sociedade de escravidão, pois há uma pessoa vestida de boi, o Mateus que é um vaqueiro, a Catirina que é uma mulher grávida com desejo de comer a língua do Boi, quando tira a língua ela perde o poder da fala. A redenção do homem negro, a ressurreição do boi é quando ele volta a dançar.
Homens negros se matavam para virar ancestrais e ajudar os outros escravizados. Na África o indivíduo vivo se encontra com o ancestral e a partir do cristianismo ele tem que morrer para encontrar com o espiritual.
Na vaquejada o mestiço caça o boi que representa o preto escravizado.
O boi no Auto do boi é o melhor boi do senhor. E pode se ver a importância da oralidade, os mascarados não falam, como os orixás no Brasil, só a corporalidade é necessária para que haja a comunicação. A fala é o vínculo visceral com o ancestral, ele não fala, mas lhe é permitido falar por ele.
A fala é importante, pois o escravizado não podia falar seu dialeto, tinham que falar português. A língua foi cortada e ele ressuscita através da dança. O corpo fala, o tambor fala, o canto...Mas a escutar é importante.

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